8 de março: a trajetória inspiradora de mulheres da UEPB a partir da perspectiva de pensadoras contemporâneas

8 de março: a trajetória inspiradora de mulheres da UEPB a partir da perspectiva de pensadoras contemporâneas
8 de março de 2023

Luta, coragem, força e garra, são palavras femininas e que carregam a essência do que é ser mulher, numa conjuntura social contemporânea na qual a visibilidade, a voz e o reconhecimento seguem padrões ditados por uma lógica patriarcal. Inseridas nesse contexto, mas, movidas por um desejo de ressignificar suas vidas, mulheres da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) se veem nas trajetórias umas das outras, impulsionadas pela força da educação.

Além de contar com uma política de ações afirmativas que permite a inclusão de mulheres negras, trans, indígenas, ciganas, com deficiência, quilombolas e egressas de escolas públicas no ensino superior, a UEPB implementa, através da Resolução 0266/2019, um sistema que estabelece 50% dos cargos de gerência superior para as mulheres.

Associada a isso, a Instituição busca desenvolver condutas de acolhimento, seja por meio da regulamentação do trabalho híbrido com flexibilização da jornada para gestantes e lactantes, ou com as atividades de aperfeiçoamento promovidas pelo Observatório de Feminicídio Briggida Lourenço com foco na prevenção às diversas formas de violência.

Ninguém nasce mulher, torna-se mulher – Simone de Beauvoir

Com uma origem humilde, desde pequena a técnica-administrativa Amanda Bispo compreendeu que precisaria trabalhar e estudar para melhorar suas condições de vida. Antes de conquistar uma vaga de servidora pública numa universidade, um sonho que acalentava, já foi manicure, babá, telefonista, cobradora de ônibus. Com muito sacrifício conseguiu ingressar na Escola Técnica da Paraíba, hoje Instituto Federal da Paraíba, onde cursou Recursos Naturais com Habilitação em Laboratório de Microbiologia e Físico Química e, após assumir um cargo na UEPB, iniciou um percurso educacional fortemente influenciado pelo contexto acadêmico que permeava seu cotidiano profissional.

“Tinha muita vontade de fazer um curso de graduação, mas, trabalhava muito, finais de semana, feriados. Estudava de manhã e trabalhava tarde e noite. Foi quando decidi passar num concurso público. Estudava sempre que tinha oportunidade, no intervalo do trabalho, dentro do ônibus, onde trabalhava como cobradora. E assim passei em todos os concursos que fiz no ano de 2007 (UEPB, CHESF, Universidade Federal do Tocantins, Prefeitura de Bayeux, Prefeitura de João Pessoa). Quando ingressei na UEPB, não enxergava a possibilidade de cursar mestrado ou doutorado, mas a UEPB me mostrou essa capacidade”, relembra Amanda.

Tendo que conviver com a diabetes desde os 13 anos de idade, Amanda aprendeu a superar desafios desde cedo e, após alcançar o emprego que sonhava, conseguiu cursar graduação, especialização e mestrado e, atualmente, é aluna do doutorado pelo Programa de Pós-graduação em Ecologia e Conservação na UEPB. Após casar e ter uma filha, a técnica-administrativa avalia que conciliar os papéis de profissional, estudante, filha, mãe e esposa requer muita determinação. Mas todas essas vivências a transformam em uma mulher forte e com garra ciente de que é possível alcançar o que se deseja. “O meu recado às mulheres é que elas não se deixem abater por dificuldades, que caminhem em direção aos seus sonhos que as coisas acontecem e acabam dando certo”, conclui.

Sigo apaixonada pela mulher que batalhei pra ser – Ryane Leão

Natural de Campina Grande, filha mais velha de uma família de quatro filhos, pai assalariado e mãe dona de casa, a professora do Câmpus de Patos, Eunice Carvalho, estudou em escolas públicas e foi desde cedo estimulada pelo pai, semianalfabeto, a estudar com o propósito de conquistar uma condição diferente da dele e das mulheres da família: avó, mãe e tias. Condição que, segundo ela, fora colocada porque lhes fizeram acreditar que o lugar de mulher era apenas no lar, submetida a uma árdua rotina doméstica e aos cuidados com os filhos.

“Isso desenvolveu em mim um sentimento de compaixão e ao mesmo tempo o desejo de construir uma trajetória capaz de inspirar e mostrar, através do meu exemplo, que o espaço que a mulher deve ocupar cabe a ela escolher, de acordo com suas aspirações. Me sentia motivada a dedicar-me cada vez mais aos estudos e não conseguia vislumbrar outro caminho para o alcance de uma trajetória diferente daquela construída pelas ‘Marias’ da minha família. Por isso, sempre digo que devo aos livros tudo que conquistei porque foi neles que encontrei, além do conhecimento que precisava, o combustível para alimentar meus sonhos’”, avalia Eunice.

Orientada por essa diretriz, Eunice ingressou na Universidade para cursar Ciências Econômicas e, no meio do caminho, a vida a surpreendeu com a morte do pai, vítima da violência urbana (assassinato). Nesse momento, segundo ela, mesmo tendo perdido o incentivador e provedor dos seus estudos, teve que conciliar as dificuldades materiais e o vazio emocional dela e da família e persistir nos estudos. Se formou, concluiu um mestrado, trabalhou viajando quilômetros para garantir o sustento da família até ser aprovada no concurso da UEPB, onde atua como docente há 15 anos. Atualmente é doutoranda em Estudos Urbanos e Regional pela UFRN.

“A minha trajetória até aqui adiou a maternidade, mas fui mãe aos quarenta anos, e, consequentemente, o doutoramento. Hoje, como profissional, mãe, dona de casa e estudante de pós-graduação, posso dizer que senti, e ainda sinto, em cada conquista alcançada, o peso de um esforço dobrado e cobrado, reflexo de uma jornada de trabalho imposta pela nossa sociedade às mulheres. Vejo, a partir de mim, que o maior desafio para a mulher moderna é abdicar da ‘perfeição’ e dos rótulos que lhe foram impostos culturalmente e continuar lutando para conquistar, de forma ampla, espaço e respeito como mulher, mãe e profissional”, declara Eunice.

Quando a mulher negra se movimenta, toda a sociedade se movimenta com ela – Angela Davis

Atendida pelo sistema de cotas da UEPB, a estudante do 2º período de Farmácia, Joyce Santos, lembra que a mulher negra ainda precisa superar muitas dificuldades para transformar uma conjuntura que não as inclui e a educação pode contribuir na busca por uma realidade mais justa e cidadã para essa parcela da sociedade.

“Cada dia conquistamos mais espaço na sociedade. Felizmente, é possível observar uma maior presença feminina no ensino superior e educação, que é a porta de entrada para que as mulheres conquistem mais espaço na sociedade. Acredito que é um grande suporte para conquistar a independência e a liberdade financeira, em especial para nós mulheres negras que somos as que mais passam por dificuldades e preconceitos. Reiteradamente ainda somos vistas como pessoas para servir. Algumas coisas já mudaram, mas a mulher negra ainda tem que batalhar todo dia para mudar essa realidade”, declara Joyce.

Dia das Mulheres
O dia 8 de março é celebrado em alusão à morte de operárias numa fábrica têxtil dos Estados Unidos no início do século XX. Com o tempo, essa data virou um marco diante de uma realidade predominantemente marcada por questões como a misoginia, a cultura do estupro e a objetificação que atingem as mulheres. Nesse contexto, os movimentos feministas se desenvolveram na busca por um cenário mais justo e equânime para as mulheres. Embora carregado de estigmas, o feminismo evidencia a luta por igualdade e respeito, conforme retrata a ativista premiada pelo Nobel da Paz Malala Yousafzai ao afirmar que “não há nada de errado em se considerar feminista. Então, eu sou feminista e todas nós deveríamos ser feministas, porque feminismo é uma palavra para igualdade”.

Texto: Juliana Marques
Fotos: Arquivo Pessoal/Divulgação