Fortalecimento da Cultura Popular tem sido um dos pontos altos da Pró-Reitoria de Cultura da UEPB nos últimos anos
Contribuir para a formação integral da comunidade universitária e da população como um todo, valendo-se da arte como fator essencial ao progresso educacional e crítico, tem sido o objetivo norteador da Pró-Reitoria de Cultura (Procult) da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), desde sua criação. Além disso, ao analisar os desdobramentos da modernidade e a aproximação da Cultura com o Mercado, o que resultou na consolidação da Indústria Cultural, a Procult vem buscando ir na contramão disso, especialmente nos últimos anos, ao fortalecer a genuína arte provinda do povo, seus costumes e saberes locais.
Contramão, aliás, é um bom termo para definir a Pró-Reitoria de Cultura da UEPB, tendo em vista, por exemplo, a própria conjuntura do País, que, em janeiro do ano passado, extinguiu o Ministério da Cultura (MinC) do Governo Federal. “Se quisermos, ainda, algo mais próximo da nossa realidade, como instituição de ensino superior, veremos que muitas pró-reitorias de cultura, hoje, não funcionam mais como setor independente, exclusivamente voltado para o assunto, mas atreladas a outras pró-reitorias. Tanto em um caso como no outro, a cultura é enxergada como algo menor, que não merece destaque, um gasto desnecessário, e, se ela for popular, teremos ainda mais desvalorização. Atualmente, uma boa parte dos chamados bens culturais é produzida em larga escala e difundida de modo abrangente, mas perdeu o conceito de identidade, de originalidade, porque tudo é mediado pelas relações de compra e venda”, explicou o pró-reitor da Procult, José Cristóvão de Andrade.
Mas, felizmente, conforme Andrade, a arte e a cultura sempre estiveram na contramão do estabelecido, no sentido da vanguarda, da imaginação, da inovação. “A arte, por excelência, significa controvérsia, polêmica, é lugar de debate, por isso concluímos que a Procult está mais do que no caminho certo ao apoiar as manifestações populares e ter um espaço dentro da Instituição reservado a planejar e divulgar a cultura. É a UEPB mostrando seu pioneirismo, fazendo a diferença e reafirmando o pensamento que é graças a Cultura que nos vemos como civilização, é ela que nos leva à empatia e ao que nos faz refletir. É por meio dela que nos enxergamos como gente. A UEPB compreende que a Cultura é a complementação da formação acadêmica humana e através dela toda a comunidade é favorecida. As políticas culturais na sociedade andam tão escassas que, muitas vezes, é somente a nossa pró-reitoria que dá o suporte necessário àqueles que sobrevivem do fazer artístico”, disse.
Com três edições, 2017, 2018 e 2019, o Encontro de Sanfoneiros e Tocadores de Fole de Oito Baixos representa bem a convicção de que aquilo que é nosso, feito pelo nosso povo, não nos faz mais importantes em relação ao que se produz em outros Estados, mas tem uma enorme importância, pois fala das nossas raízes, nossas histórias, do nosso jeito de viver no mundo. É como uma criança que diz para outra: “Olha, isso é meu, tem na minha casa, vem ver como é bom!”.
Por ora cancelado, em decorrência da Covid-19, nesses três anos o Encontro percorreu o chão batido e os asfaltos da Paraíba, levando não apenas a autêntica música nordestina para milhares de pessoas, em praças, escolas, teatros e universidades, mas capacitando artistas com o corpo docente qualificado que integra a UEPB. Oficinas de pandeiro, de danças populares, de sanfona de oito baixos, exposições e lançamentos de livros tendo como veio a matriz regional, foram algumas das atividades propostas e que receberam uma recepção calorosa do público.
Daguia e Seu Antônio
Eles dizem que é quase como a história do ovo e a galinha. Não dá para saber quem veio primeiro, se foi o casal, se foi Daguia, se foi Seu Antônio, mas sempre deixam bem claro que um é do outro, tanto que são conhecidos assim: “Daguia de Seu Antônio” e “Seu Antônio de Daguia”. E só de casamento lá se vão 59 anos. Homenageados durante o 2º Encontro de Sanfoneiros, eles, que moram no Sítio Campinote, em Lagoa Seca, guardam com orgulho e carinho o certificado de participação no Encontro de Sanfoneiros da UEPB, recebido em Campina Grande, no palco do Teatro Municipal Severino Cabral, onde nunca haviam se apresentado antes, em tanto tempo de carreira.
Daguia, 77, e Seu Antônio, 82, foram agricultores quase que a vida inteira e participam do evento desde a primeira edição. Mais jovens, apresentaram-se em bares e feiras de Campina, bem como nas palhoças do Maior São João do Mundo, ela no pandeiro, ele na sanfona. Aos domingos, a alegria deles é receber os vizinhos, para quem fazem shows improvisados no quintal. Nessas ocasiões, a magrinha e simpática Daguia coloca um vestido bem colorido e, no ápice do espetáculo, costuma bater o pandeiro nos joelhos, no ritmo das músicas. A plateia, claro, aplaude efusivamente. Assim foi também no Teatro. O pró-reitor de Cultura da UEPB assistiu a uma dessas exibições caseiras da dupla e ficou encantado. “Eles amam o que fazem e realmente se sentem honrados pelo convite anual feito pela Universidade para que componham a nossa programação”, apontou.
Juntando-se à Daguia e Seu Antônio, o Encontro de Sanfoneiros, enquanto prática voltada a agregar os artistas e articular o conhecimento, recebeu centenas de artífices da sanfona e das artes em geral, ganhando a estima de toda classe artística. Estiveram nele, por exemplo, Flávio José, Biliu de Campina, Helinho Medeiros, Rainere Travassos, Novinho do Acordeon, Lucilio Souza, Gitana Pimentel, Marcos Farias, João Calixto, Cris Lima, a Orquestra Rural Vó Maria, Olga Soares, Joana Alves e Kydelmir Dantas, entre outros.
A iniciativa da UEPB reverberou, inclusive, em outras mentes, posto que inspirou o #Movimento Respeitem os 8 Baixos, efetuado no Recife (PE), pelo Museu Cais do Sertão. A ação surgiu quando se constatou que esses profissionais não encontram mais espaço nas festas tradicionais ligadas à arte da sanfona, notadamente no São João pernambucano. Conforme o Movimento, essa situação vem se tornando regra nos outros municípios daquele estado.
O Forró que Resiste
Trazer à baila os genuínos ritmos do Nordeste é também o enfoque do “Forró da Resistência”, evento criado pela Procult em 2018, realizado, igualmente, em 2019, mas que não teve edição este ano, devido à crise sanitária proveniente do Novo Coronavírus. De acordo com o pró-reitor de Cultura, a iniciativa, que ganhou bastante visibilidade por homenagear o cancioneiro dos grandes mestres, como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Marinês e Dominguinhos, deve continuar tão logo seja possível.
Efetuado em junho no Centro Artístico (CAC) da Universidade Estadual da Paraíba, de modo totalmente gratuito, o evento traz xote, baião, xaxado e tudo que a região dispõe de mais autêntico em termos musicais, contando com a participação de grupos de Campina e de localidades próximas, além dos docentes do CAC. Na programação ainda se inclui salão de artesanato, comidas típicas e exibições de repentistas para reproduzir fielmente a riqueza da atmosfera nordestina.
Conforme o esperado pela Procult, forrozeiros, artesãos, dançarinos, gestores, produtores, pesquisadores, professores, estudantes e ativistas culturais, entre outros, abraçaram a ideia de pronto, com o objetivo de lustrar o brilho das expressões de caráter popular, para que não sejam ofuscadas. Estima-se que mais de mil pessoas estiveram nos eventos, tanto atuando nas atividades, como na plateia, dada a interatividade da iniciativa.
O pró-reitor lembrou, ainda, que a UEPB se faz presente nos principais debates versando sobre o assunto, a exemplo do Fórum Nacional de Forró de Raiz, movimento fundado em 2011 com o objetivo de promover ações de salvaguarda do Forró como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro. “A UEPB entende e tece a Cultura de uma maneira ampla, complexa de práticas e dimensões e o nosso intento é acompanhar esses fluxos culturais que exaltam as nossas tradições”, assinalou Andrade.
Texto: Oziella Inocêncio
Fotos: Asley Ravel – Arquivo Procult/Codecom