Ancestralidade e resistência: arte e preservação da cultura em pauta no 4º Congresso Universitário da UEPB

8 de novembro de 2024

Criado a partir de um projeto de extensão da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), o grupo de teatro “Experieus” este ano completa uma década de existência. E para comemorar esse marco, estão passando por diversas cidades da Paraíba com o espetáculo “O ancestral em nós: Conexões entre Corpos e Vozes”. Nesta quinta-feira (7) foi realizada uma apresentação na 4º edição do Congresso Universitário da UEPB trazendo uma experiência de conexão com as duas principais matrizes brasileiras: a dos povos originários e a negra.

Mesclando diversas linguagens artísticas presentes na cultura brasileira, o espetáculo reafirma a força dos povos originários, dando destaque a Tibira, um indígena tupinambá vítima de um crime homofóbico no Nordeste durante o século XVII. “Nossa linguagem está muito conectada a uma sonoplastia ao vivo, sem eletrônicos. Usamos instrumentos de percussão e sopro que afetam nossos corpos de maneiras únicas. Esse trabalho sonoro é imprescindível para sentir essa vibração física”, explicou a atriz e diretora do grupo “Experieus”, Cristiane Agnes.

Além de ser uma figura que simboliza força, a história de Tibira tornou-se uma bandeira para o movimento LGBTQIAP+ e outros segmentos. Joyce Lima, atriz que interpreta Tibira, vem de descendência indígena, e nesse espetáculo é a representação da perseverança. “É um prazer trazer a ancestralidade indígena e fazer parte dela, falar sobre tantas vozes que foram silenciadas por tanto tempo. Quando eu trago o nome Joyce, eu trago o nome de outras mulheres também, então eu levo a ancestralidade no texto e Tibira na força”, disse a atriz.

A arte em seu significado mais intrínseco é a liberdade da criatividade do ser humano ao expor suas emoções e sentimentos. Para Cristiane Agnes, a arte é como uma forma de redescobrir a vida, “é uma prática que nos ajuda a viver de forma mais autônoma e condizente com as nossas crenças”, afirmou. A arte indígena, sendo uma das bases fundamentais da cultura brasileira, desempenha um papel vital na preservação da identidade cultural dos povos originários, transmitindo a ancestralidade em suas tradições, conhecimentos e sua relação com a natureza e espiritualidade.

Esses povos, em suas manifestações artísticas, exploram recursos naturais do seu próprio território, como a argila, palha, sementes, penas e fibras vegetais, os quais são transformados em joias, cerâmicas, esculturas, cestos, entre outros objetos. A riqueza simbólica deles também está presente nas pinturas corporais e faciais, que possuem significados específicos, como representar a identidade tribal, transmitir proteção espiritual ou celebrar momentos cerimoniais.

Historicamente, o preconceito e a colonização cultural contribuíram para a desvalorização dessa arte. O professor de história, Ednaldo Pereira, explica que toda a violência histórica cometida contra os povos originários do Brasil e negros culminou em uma série de percas. “A própria catequização da época era uma maneira de apagar a crença e a identidade de um povo, colocando-as como diabólicas, como um meio de unificar todos os grupos ao cristianismo de uma forma forçada. Apesar de resistirem a colonização, a luta dos povos originários pelo reconhecimento da sua cultura é contínua. Devemos lembrar que a sua importância vai além da história, seus saberes são fundamentais para a vida, a medicina, culinária e seus cuidados com a natureza precisam ser evidenciados cada vez mais, são heranças marcantes no nosso cotidiano”, destacou o docente.

Nos últimos anos, movimentos dos povos indígenas e sua cultura, têm sido uma fonte inesgotável de inspiração para inúmeros artistas contemporâneos ao redor do mundo, como Adriana Varejão, Jaider Esbell, Sueli Maxakali, e o próprio grupo “Experieus”. Ao incorporarem elementos culturais indígenas em suas obras, além de enriquecerem sua própria linguagem artística, contribuem para o diálogo contínuo sobre identidade, pertencimento e memória coletiva.

A arte mais do que uma forma de expressão, tem a função de servir como uma ponte entre o passado e presente, e em um país em que a maioria ainda resiste em reconhecer e valorizar suas raízes, ela garante que a história e as tradições dos povos originários continue a ressoar nas gerações futuras. A arte indígena simboliza resistência, e a luta pela sua valorização é uma luta pelo direito de preservar e transmitir o conhecimento ancestral, pela memória e pela identidade de seus povos.

Entrevistas: Sarah Silva, Eduarda Alves, Maria Eduarda Aragão e Vitória Oliveira (Estudantes de Jornalismo)
Texto: Vitória Oliveira
Fotos: Sarah Silva e Vitória Oliveira