Dia da visibilidade trans: política de cotas e ações de acolhimento são implementadas na UEPB
Incluir, reconhecer a diversidade, promover a equidade e o respeito, enfrentar a discriminação e violência, são algumas das principais motivações que inspiram ações implementadas na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) voltadas à população LGBTQIAP+, em geral, e às Travestis e Transsexuais(TT), em particular.
Desde 2017 na UEPB, através da Resolução UEPB/CONSUNI/0202/2017, travestis e transsexuais podem solicitar o uso do nome social na documentação acadêmica. Além disso, recentemente, foi aprovada a política de reservas de vagas, garantindo o acesso aos cursos de Graduação e Pós-Graduação da Instituição as pessoas indígenas, ciganas, negras, quilombolas, portadoras de deficiências, com vulnerabilidade socioeconômica, transgênero, travestis e transexuais. A medida, que será implementada a partir do período 2022.1, busca contrapor um processo histórico de exclusão social no país que fomentou entraves para o acesso desta população à educação de nível superior.
Para a graduanda de Psicologia da UEPB, Laura Brasil, que é travesti e que atua como coordenadora do Centro Estadual de Referência dos Direitos LGBTQIAP+ e combate a LGBTfobia da Paraíba em Campina Grande, é preciso reconhecer uma fragilidade estruturante quando se pensa o acesso de determinados grupos em vulnerabilidade nos espaços educativos, principalmente quando se pensa na manutenção de sua permanência efetiva com as devidas condições básicas para tal. Segundo ela a política de cotas traz esse reconhecimento e aponta para o lugar de dívida histórica que a sociedade cisheteronormativa tem em relação às pessoas trans.
A estudante do curso de Filosofia, Maya Queiroz, que é travesti identificada com o movimento transfeminista, avalia que as cotas são parte de uma construção, uma oportunidade de garantir o acesso das pessoas trans à educação superior, mas, é importante que esta iniciativa esteja articulada a outras ações que possam auxiliar na permanência dessa população na universidade.
De acordo com a pró-reitora Estudantil, professora Núbia Martins, A Pró-reitoria Estudantil (PROEST) deve realizar um mapeamento e a promoção de algumas ações para atender às pessoas trans que ingressem na UEPB. A pro-reitora destaca que o setor dará apoio irrestrito para que esta política seja implementada com sucesso na Instituição.
No âmbito do Observatório de Feminicídio da Paraíba Briggida Rosely de Azevêdo Lourenço o Dia Nacional da Visibilidade Trans, celebrado em 29 de janeiro, oportuniza a divulgação de uma campanha nas mídias sociais com materiais que dialogam sobre pautas importantes relacionadas às pessoas trans. Mesmo com as restrições de atividades presenciais em decorrência da pandemia de covid-19, o setor tem realizado ações, seja por meio de campanhas ou webinários.
Tais iniciativas são consolidadas em meio a um cenário adverso para as pessoas TT. Dados divulgados pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) referentes aos assassinatos de transexuais em 2021, evidenciam que o Brasil continua pelo 13º ano consecutivo sendo o país que mais mata pessoas trans e travestis no mundo, o que culmina numa expectativa de vida móvel em torno de 35 anos e impacta diretamente no acesso a direitos básicos como segurança, saúde e educação.
“Levando em consideração o crescente dado de violência contra pessoas trans e travestis no Brasil, juntamente com as constantes tentativas de mitigar os direitos conquistados até então por parte da agenda conservadora, há de se fazer o reconhecimento que a luta pela cidadania plena por parte da população TT ainda tem um longo percurso pela frente. O momento atual em que vivemos tem se mostrado uma oportunidade chave para isso, uma vez que temos um referenciamento cada vez maior de pessoas TT ocupando lugares estratégicos na política, academia e na mídia. Ao passo que fazemos nossas vozes ecoarem, fortalecemos nossa rede para que a realidade das próximas gerações seja ainda mais potente e livre. O dia da Visibilidade Trans é um lembrete de nós para nós desse objetivo comum: deixar de apenas sobreviver para enfim viver plenamente”, avalia Laura Brasil.
Para Maya Queiroz, a transfobia é uma realidade presente não apenas nas agressões físicas, mas, sobretudo, nos ataques verbais, nas retaliações, no silenciamento do discurso de pessoas trans. “Eu vivi situações em que, ao usar o banheiro feminino percebia as mulheres saindo após a minha chegada. Via olhares, risadas, perguntas desnecessárias. Questionam minha identidade. Eu tenho uma cicatriz que é da exclusão e não quero que a romantizem. É preciso que as pessoas entendam que as pessoas trans existem e ignorar a nossa existência é uma violência”, explica.
As duas graduandas, que vivenciaram a transição de gênero enquanto estudantes da UEPB, evidenciam a importância da Universidade como lugar de emancipação social e ressaltam o compromisso que assumem diante das causas que atendem à população trans. “Sou natural de Barra de Santana, filha de empregada doméstica e cresci vendo familiares professoras que melhoraram de vida com base na educação. Então, eu tento seguir esse exemplo. E sigo com esperança, em movimento, construindo o meu futuro hoje, o futuro que eu quero, que não deve terminar em mim, mas, deve contemplar outras pessoas trans que seguem enfrentando dificuldades como as que eu enfrento cotidianamente”, reflete Maya.
Segundo Laura, essa vivência que as aloca enquanto primeiras travestis do curso traz elementos de solidão e medo. “Primeiro por não encontrar outras referências próximas e segundo pela exotificação social, o que acaba sendo uma forma velada de violência e, com isso, um entrave para permanência nesse espaço. Ainda assim, a formação de redes de apoio e o desenvolvimento de ações afirmativas dentro do local em que ocupo me possibilitaram o olhar de compromisso ético-político com a luta das que se foram para que eu ocupasse esse lugar e com as que ainda virão. A posição em que me vejo, hoje, é a de tensionar os diversos espaços, de referenciar a potência das trans e travestis do meu entorno e assim poder construir realidades outras”, conclui.
Neste sentido, com o objetivo de permitir a inclusão das pessoas historicamente excluídas do processo de ingresso nas graduações e pós-graduações, a UEPB segue não apenas com políticas de gestão, mas, no âmbito das atividades de ensino, pesquisa e extensão, fomentando o atendimento do que preconiza o artigo 3º da Constituição Federal de 1988, que prevê a erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais e regionais, sem preconceitos de origem, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Texto: Juliana Marques
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