Museu de Arte Popular da Paraíba recebe exposição “A Feira de Campina Grande: poéticas e imaginários”
Em uma época em que boa parte do que consumimos é adquirido pela internet, com a facilidade e frieza de um clique, bastante gente adora e continua celebrando esse “quase ritual” que é ir à feira. Não é para menos: antes que a publicidade propagasse por aí, a máxima “não compre um produto, compre uma experiência”, na feira isso não era apenas uma estratégia de vendas, era uma realidade há séculos. E, particularmente a nossa feira, a Feira de Campina Grande (também chamada “Feira das Feiras”), é reconhecida como Patrimônio Cultural do Brasil desde 2017, pela riqueza estética que transborda.
Agora, novamente todos os holofotes se voltam para ela, na exposição “A Feira de Campina Grande: poéticas e imaginários”. A abertura acontece na quinta-feira (9), às 19h, no Museu de Arte Popular da Paraíba (MAPP), da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), com entrada franca. Assim, a temática escolhida perpassará os três espaços circulares do MAPP: Sala 1 – Arte Popular, Sala 2 – Música, e Sala 3 – Cordel e Xilogravura.
Nesse sentido, os últimos dias foram de ultimar os detalhes no Museu para receber os visitantes, posto que anualmente esse é o evento mais importante no calendário do MAPP. Além disso, o tom local é de alegria, afinal o Museu ficou dois anos fechado ao público, em razão da covid-19.
A Feira nas salas
Quem for ao MAPP poderá conferir, na Sala 1, o trabalho de artistas dos mais diversos segmentos e materiais. Esculturas e pinturas estão entre as peças à mostra, sendo que integram, ainda, a vasta coleção, parte do acervo fotográfico de Machado Bittencourt, com stills do documentário “A Feira” (criado por ele, em parceria com Luiz Barroso), que serão mostrados pela primeira vez. Esta foi, inclusive, a estreia de Bittencourt na produção da sétima arte, datando a obra de 1967.
Guariguazi de Lima Tavares (considerado “o escultor das cores”), Nevinha das Bonecas (e seus trabalhos em cerâmica terracota) e Fábio Smith (com seu esmero na modelagem em barro), são alguns dos artistas que igualmente figuram na Sala 1. Já na Sala 2, a disposição do ambiente remete à um grande estúdio. Nele, haverá a gravação de um podcast intitulado Rádio Difusora, que será gravado semanalmente, e do qual participarão músicos, cantadores e emboladores, perfazendo uma homenagem a esses trabalhadores, famosos por animarem os dias de pico da Feira. A Sala de Música também exibirá uma interface mapeada, oportunizando ao público a interação com o conteúdo digital disponível.
No mesmo local, haverá um espaço chamado “Talk” – palco aberto à participação dos artistas da música – bem como uma exposição de instrumentos musicais caros ao universo da Feira, e uma espécie de retrospectiva, contemplando algumas das homenagens já feitas pelo MAPP, por exemplo, às ceguinhas de Campina Grande, a Duduta e Zé do Pife.
Cenário por excelência da performance dos bardos, a Feira sempre foi um local que fortaleceu a cadeia produtiva do cordel e, na Sala 3, através de uma seleção de documentos autênticos, realizada a partir da Biblioteca de Obras Raras Átila Almeida (BORAA), o visitante encontrará uma enorme variedade de elementos que compõem a seara poética. São folhas soltas, romances, folhetos, xilogravuras e matrizes de gênios da área, a exemplo de Manoel Camilo dos Santos, Alfrânio de Brito, Josafá de Oroz, José Alves Sobrinho, Ciro Fernandes, Antônio Lucena, Costa Leite, Apolônio Alves dos Santos, Marcelo Soares e Antônio da Mulatinha.
Além disso, será exibido um vídeo na Sala 3, tendo como mote o fazer cordelístico. O protagonista será aquele que foi um dos mais brilhantes poetas que a Rainha da Borborema já conheceu: Manoel Monteiro. Antônio da Mulatinha e ele, aliás, foram alguns dos que permaneceram com a venda de cordéis na Feira de Campina.
A alma da cidade
Curadora da Sala 3, junto com Alfrânio de Brito, a professora Joseilda Diniz assinalou que a Feira é um espaço estético, de fluxo de diálogos e conexões, de entrecruzamentos de culturas e etnias, mas, sobretudo, um espaço da narrativa existencial, no sentido mais humano. “Nele homens e mulheres viveram e vivem plenamente o labor de um ambiente de grandes emoções, onde se tecem as relações de trabalho, os imaginários, as poéticas. Nessa colcha de retalhos, reside a alma da cidade e sua diversidade, seus falares, sotaques, costumes, seus modos de ser, agir e estar nesse mundo chamado Campina Grande, Paraíba e Brasil, que é único e ao mesmo tempo universal”, ressaltou.
A cineasta Rebeca Souza assina a curadoria da Sala 2. Já a sala 3 teve a curadoria efetivada por ela e por Hipólito Lucena, coordenador de Comunicação da UEPB, que também é cineasta. Para Rebeca, a história de Campina se confunde com a história da Feira Central. “Antes de Campina ser emancipada, a Feira já existia e depois de quatro séculos, ela continua pulsante. É isso que queremos contar aqui, trazendo, ainda, um olhar crítico, pois ela tem seu apogeu e seus momentos de derrocada. Eu vejo a Feira como um espelho, onde se refletem tanto as esperanças do povo da cidade, como suas contradições e desigualdades”, ponderou.
Texto: Oziella Inocêncio
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