Projetos contra o racismo e em favor da cultura são homenageados na Câmara Municipal de Campina Grande
Na manhã da quarta-feira (20) a Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) foi lembrada em três homenagens feitas na Câmara Municipal de Campina Grande. Na oportunidade, o Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neab-í) e o Batuque Nagô foram agraciados com a Medalha Arnaldo França Xavier. Já o Programa Campina Cultural recebeu um Voto de Aplauso. Tais iniciativas se deram a partir da vereadora Jô Oliveira, durante uma Sessão Especial proposta por ela, notadamente em razão da data de 21 de março, o Dia Internacional para Eliminação da Discriminação Racial.
“O Neab-í fica muito feliz com essa comenda, é um reconhecimento importantíssimo para nós, que temos quase duas décadas de trabalho nesse sentido, pois fomos um dos primeiros núcleos a ser implantados. Nossas atividades são desenvolvidas em diversas frentes, no combate ao racismo e à discriminação, na luta pela promoção à igualdade racial e todas essas práticas passam pelo processo de educar. É essencial que a gente compreenda que só a educação é capaz de reverter essa concepção totalmente equivocada que move a sociedade brasileira”, explanou, na ocasião, a professora Cristiane Maria Nepomuceno, representante do Neab-í.
Acerca do tema, a docente pontuou como permanece uma constante no cotidiano a reprodução de atitudes errôneas, sem que se reflita sobre isso. “É o caso, por exemplo, das residências que são construídas tendo dependências separadas, as ‘dependências da empregada’, expressões das senzalas, em que para acessar a casa é preciso ir pelo quintal. Há aqueles que ainda acham que a última pessoa que deve dormir é a empregada e que deve ser ela a primeira a acordar. São aspectos amplamente presentes em nosso dia a dia, quando falamos em relações de trabalho doméstico, e que mostram como há muito chão para que seja extinto esse modelo social”, disse Cristiane.
Em sua fala, o idealizador do Batuque Nagô, Zé Luan Costa, que também é servidor da Pró-reitoria de Cultura (PROCULT) da UEPB, ressaltou o caráter antirracista do Grupo, voltado à diversidade, e igualmente como lócus de prática, formação e difusão das manifestações artísticas populares. “Agradeço aqui em nome de todos os componentes do Grupo, o Maracatu não se faz sozinho, é uma homenagem que alcança cada integrante do Batuque Nagô, tanto quem está na percussão, como aqueles que nos prestigiam, dançam, batem palmas, participam dos eventos”, acrescentou.
Luan destacou que o Batuque Nagô está sempre ocupando os espaços culturais disponíveis – uma das premissas do Grupo, – e aproveitou a oportunidade para externar uma sugestão aos vereadores. “Não esperamos pelas condições ideais, fazemos com a nossa vontade e com o que é possível, levamos nossas ações para escolas, para a periferia. Inclusive, gostaria de deixar uma observação relacionada à uma lei municipal, referente ao Código do Meio Ambiente. Na parte de emissão de ruídos, ele menciona, entre outras, atividades religiosas e apresentações de fanfarras”, explicou. A sugestão de Luan é que se possa pensar numa forma de incluir grupos de percussão, escolas de samba e bois de carnaval, para que estejam amparados pela lei.
“Se compararmos, por exemplo, a fanfarra e o maracatu, a ‘tipologia’ é a mesma. Ano passado, a propósito, tivemos problemas com isso, houve uma denúncia a um evento da gente, denúncia esta possivelmente com teor racista, levando-se em conta que caso fosse uma iniciativa religiosa, talvez isso não acontecesse”, salientou.
Aplausos ao Campina Cultural
O Programa de Extensão Campina Cultural nasceu em novembro de 2020. Foi idealizado pelos estudantes de Jornalismo Eduardo Gomes e Bruna Araújo, ao lado dos docentes Ada Guedes, que coordena a iniciativa, e José Cristóvão de Andrade, pró-reitor de Cultura da UEPB.
Durante a homenagem, a professora Ada Guedes sublinhou quão fundamental é que a Universidade assuma a função de ouvinte e aprendiz. “Quanto mais nos aproximamos dos fazedores da cultura, mais o nosso projeto é enriquecido por essa vivência. Através dela, a Universidade se instrui e refaz seus olhares”, apontou.
Já o professor Andrade endossou o quanto o Programa é motivo de orgulho para a UEPB. “O Campina Cultural possui a marca do profissionalismo, da dedicação e da competência. Desde que surgiu na Rainha da Borborema, ele tem se notabilizado pela excelência na área do Jornalismo Cultural, mobilizando a sociedade para as demandas da arte local e divulgando os eventos da cena criativa regional, fortalecendo-a. É uma vitrine da nossa Instituição e dos artistas da Rainha da Borborema, refletindo o brilhante trabalho feito por essa grande equipe”, afirmou.
Assim, ao longo de sua trajetória, o Campina vem realçando e difundindo o panorama artístico do município, colaborando, ainda, para a produção e circulação do conhecimento científico, bem como contribuindo para a formação de futuros profissionais. Nesse percurso, somam-se os esforços de seus ‘ativistas midiáticos’, como eles próprios se denominam, a saber, Ana Luísa Rocha, Eduardo Araújo, Felipe José e Taysom Maytchael; dos colaboradores Rafael Melo, Renato Hennys, Radamés Rocha, Joseilda Diniz; e de aproximadamente 50 estudantes universitários que compõem ou já passaram pelo Programa e que são provenientes de inúmeras regiões nordestinas.
Mais sobre o Batuque Nagô e o Neab-í
O Batuque Nagô é um grupo de percussão que tem suas origens em abril de 2018, como Batuque Ayan, tendo sido mudado o nome deste para aquele. Idealizado pelo percussionista, luthier e produtor cultural Zé Luan Costa, o grupo realiza de forma contínua oficinas de percussão, dança, apresentações em eventos, escolas públicas, espaços coletivos e comunitários. Também elabora projetos no intuito de criar ambientes de fruição e conexão do público com os grupos locais – iniciativas, aliás, já conhecidas da agenda dos campinenses como o “Arrasta Axé”, “Batuque na Praça” e “Batucada dos Erês”.
O Batuque Nagô é parceiro de variados eventos propostos pela UEPB e seus ensaios ocorrem no Centro Artístico Cultural (CAC) da Instituição. O grupo se organiza dentro da Associação Cultural Baraúna, entidade que busca gerar desenvolvimento educacional, social e cultural por meio da música, artes plásticas, dança, pintura, artesanato, literatura e outras formas de arte. No repertório dele, estão músicas de tradição popular e composições próprias, executadas com base no Maracatu de Baque Virado, Ijexá, Nagô e demais ritmos originários do Candomblé Nagô e da Jurema Sagrada.
O Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas foi implantado pelo professor José Benjamim Pereira Filho, em julho de 2006. É composto por docentes da UEPB advindos dos cursos de História, Educação, Sociologia e Serviço Social, além de professores de outras universidades do Estado, estudantes e ex-alunos da Instituição, bem como representantes das comunidades étnicas.
A ideia da fundação do Núcleo era ter um espaço de visibilidade, de receptividade e de representação das populações afrodescendentes na UEPB e em Campina Grande, abarcando, além disso, as comunidades africanas. Naquele contexto, encontravam-se na UEPB alunos oriundos de Cabo Verde, fato que inspirou em grande medida o acontecimento. Assim, vários eventos foram articulados e, em vista do significado dessa ocasião, se pensou a criação do Núcleo, inserindo-se, igualmente, as populações indígenas.
Dentre as atividades efetuadas pelo Neab-í figuram debates, mesas redondas, palestras, visitas e passeios para além das práticas que se referem à produção acadêmica de pesquisa, ensino e extensão.
Texto: Oziella Inocêncio
Fotos: Carla Batista e Marcos Moraes (via Ascom Jô Oliveira)
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