Projeto Cidadania é Liberdade possibilita ressocialização a partir de atividades profissionais na UEPB

21 de maio de 2021

Música erudita e negócio próprio: reeducandos do sistema prisional trilharam caminhos distintos na ressocialização por meio de atividades profissionais na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), mas todos com saldo positivo. O projeto Cidadania é Liberdade existe há 18 anos, resultado de convênio entre a Instituição e a Secretaria de Administração Penitenciária do Governo do Estado (SEAP/PB). Desde 2003, a iniciativa ajudou na ressocialização de mais de uma centena de reeducandos por meio de trabalho e assistência social.
O convênio estabelecido entre SEAP/PB e UEPB está inserido no eixo trabalho, portanto, tem o objetivo de promover a ressocialização de reeducandos do Sistema Penitenciário do Estado da Paraíba que se encontram cumprindo pena em regime aberto, semiaberto ou em livramento condicional por meio de sua mão de obra. O acordo tem funcionado sem interrupção desde 2003 e é renovado anualmente.
A UEPB possui 55 vagas para trabalho por meio do convênio e uma nova oportunidade é aberta somente quando o reeducando completa sua pena, ou for por algum outro motivo desligado do projeto. O setor de Serviço Social da Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas (PROGEP) é responsável pelo acompanhamento mensal dos reeducandos e sua ressocialização por meio do trabalho. A PROGEP afirma que as atividades laborais desempenhadas pelos reeducandos são essenciais para a UEPB, pois estes desempenham funções de apoio administrativo, manutenção predial e de equipamentos, limpeza, entre outros, atualmente distribuídos nos câmpus I, II, III, V e VII.
Os reeducandos são remunerados, porém, não possuem vínculo empregatício com a UEPB. A cada três dias trabalhados no projeto, é reduzido um dia de suas penas. Pelas regras do convênio, 5% do salário é retido mensalmente, sendo integralmente devolvido ao participante ao final do cumprimento da pena. Segundo a Progep, o auxílio é uma forma ajudar no recomeço da nova vida do cidadão reinserido em sociedade.
Segundo a assistente social da PROGEP, Juliana Grangeiro, responsável pela supervisão do Cidadania é Liberdade, o projeto, além de possibilitar a ressocialização através do trabalho e redução da pena, contribui para a não reincidência criminal. “Temos muitos resultados positivos através do Projeto Cidadania é Liberdade e as atividades que os trabalhadores desempenham são essenciais à UEPB. Dentre os reeducandos que finalizaram sua pena no mês de maio, está, por exemplo, um estofador que contribuiu para recuperação de estofados de dezenas de cadeiras da UEPB, gerando a economia de custos para Instituição. Hoje, ele possui sua própria empresa de estofados e através do aprimoramento do ofício que já possuía, termina sua pena tendo um projeto de vida”, relatou Juliana.
Negócio e música
Em maio, oito reeducandos, seis lotados no câmpus I e dois do câmpus VII, terminaram suas penas durante o período que estavam prestando serviço à UEPB. Um deles é Luciano Lourenço, que estava no projeto desde 2017 e trabalhava com estofaria na UEPB. Ele afirma que gostou muito da sua experiência no projeto, trabalhava no que sabia e irá continuar investindo em seu negócio com o dinheiro que receber.
Outro reeducando, Klebson Rocha, lotado no Setor de Serviços da Pró-Reitoria de Administração (PROAD), está no projeto desde 2016. Na UEPB, além de trabalhar, Klebson também fez o curso Pró-Enem e, em 2018, foi aprovado em Licenciatura em Música da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). “Para mim foi uma oportunidade imensa. Cheguei aqui e o pessoal me acolheu através do projeto. Aqui fiz cursinho pré-vestibular, pude entrar na universidade. Foi maravilhoso para mim”, afirmou.
Klebson conta que seu interesse em música começou com a percussão, de forma autodidata. Hoje, sua habilitação no curso é em flauta doce. Ele conta que o curso superior oferece uma ampla visão da área, mesmo tendo como base a música erudita. Cumprimento de pena e música erudita geralmente não são assuntos pensados juntos, mas tais experiências comprovam que, apesar do preconceito e desinformação, a ressocialização é possível.
O reeducando não disse quando termina sua pena, afirmando que segue no trabalho até a condenação ser extinta. “Tem dois lados nisso. O lado bom é continuar no projeto. O lado ruim é ainda dever à justiça”, disse Klebson. Ele comenta que gostaria de, na UEPB, estar trabalhando na sua área de estudos. A Instituição não possui curso superior em Música, mas oferta cursos de iniciação em alguns instrumentos, por meio da Pró-Reitoria de Cultura (PROCULT). Porém, os horários conflitam com seu curso de graduação e, por hora, ele segue seu trabalho na PROAD, não deixando de investir nos estudos.
Trabalho, ressocialização e função social
O setor de Serviço Social da PROGEP compreende que o trabalho de ressocialização com os reeducandos vinculados aos projeto não se restringe apenas no acompanhamento de sua frequência no trabalho. Além de outras frentes de atuação na UEPB, o setor tem implementado diversos procedimentos de acompanhamento dos participantes e da promoção da cidadania, como atendimentos aos reeducandos e familiares, entrevistas individuais de inserção e acolhimento, visitas aos setores para acompanhamento.
Há, ademais, realização de oficinas socioeducativas, com temáticas sobre trabalho, direitos sociais, saúde e profissionalização, parcerias entre alunos, professor e reeducando nas atividades de campo, além de avaliação de desempenho junto as chefias, entre outros. Em 18 anos do projeto na UEPB, quase 120 pessoas dos regimes aberto, semiaberto e liberdade condicional passaram pela instituição.
“Dentre estes há aqueles que estão trabalhando de carteira assinada ou abriram seu próprio negócio, o que reforça a finalidade do projeto em oferecer, de fato, ressocialização por meio do trabalho”, frisa Juliana Granjeiro. A PROGEP afirma que o Cidadania é Liberdade, além de oportunizar o trabalho e acompanhamento de reeducandos no seu processo laboral, contribui para sanar um dos grandes desafios que se apresenta para homens e mulheres que cumprem pena no sistema penitenciário brasileiro, que é o processo de reinserção na vida em sociedade após o cumprimento da pena, ou no momento que passam para o regime semiaberto ou aberto. Desta forma, o projeto possui também um fim educativo e produtivo.
Texto: Juliana Rosas