Jovens Cientistas: como a Iniciação Científica molda o futuro acadêmico e profissional de estudantes universitários da UEPB
Criada em 1951, no mesmo ano da fundação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), a bolsa de Iniciação Científica se consolidou como uma das principais portas de entrada para jovens no universo da pesquisa. Inicialmente voltada a despertar o interesse de estudantes pela ciência, a iniciativa evoluiu ao longo das décadas, ampliando seus objetivos e formas de atuação.
Atualmente, o programa conta com modalidades institucionais cujos recursos são destinados a universidades e centros de pesquisa. Além do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC), outras frentes têm sido implementadas com foco na formação científica e tecnológica de estudantes.
O Programa Institucional de Bolsas de Iniciação em Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (PIBITI) é direcionado à iniciação tecnológica e à inovação entre alunos da graduação. Já o Programa Institucional de Iniciação Científica nas Ações Afirmativas (PIBIC-Af) é voltado para estudantes que ingressaram na universidade por meio de políticas afirmativas.
Para o nível médio, há o Programa Institucional de Iniciação Científica para o Ensino Médio (PIBIC-EM), enquanto o Programa Institucional Voluntário de Iniciação Científica (PIVIC) é voltado a estudantes que não recebem bolsa, mas desejam desenvolver atividades de pesquisa.
Conforme o coordenador geral de pesquisa da UEPB, professor Manuel Antonio Gordón-Núñez, a Iniciação Científica, como política acadêmica, desempenha papel essencial na formação sólida e atualizada da comunidade universitária, estabelecendo bases fundamentais para o desenvolvimento profissional futuro, pois “Oportuniza o acesso de discentes ao universo vasto de oportunidades de pesquisa em diversas áreas do conhecimento, possibilitando a apropriação de saberes e a potencialização de habilidades e competências que contribuem para o desenvolvimento de acadêmicas e acadêmicos”.
Para o coordenador, elas e eles se destacam como indivíduos dotados de pensamento crítico, capazes de promover o avanço da ciência por meio de novas ideias para a solução de problemas e inovações com repercussão positiva no progresso científico e no desenvolvimento da sociedade em todos os aspectos. Ainda segundo Gordón-Núñez, a UEPB vem pautando desde há anos, “o estímulo e o fomento à IC, com valiosos exemplos de projetos desenvolvidos por discentes sob orientação de docentes da instituição, que têm contribuído e seguem contribuindo para a formação de excelentes profissionais”, enfatizou..
Histórias moldadas pela Iniciação Científica
A Iniciação Científica na UEPB começou em 1994 e transformou a vida de muitos estudantes, nas mais diversas áreas do conhecimento. Um exemplo dessa transformação é Josivânia da Cruz Vilela, doutoranda Programa de Pós-Graduação em Literatura e Interculturalidade (PPGLI).
Sua trajetória foi literalmente transformada pela Iniciação Científica. “Cursei toda a educação básica em escola pública, sendo que até a 4ª série do ensino fundamental estudei na zona rural [de Monteiro], onde resido, e da 5ª série até o 3º ano do ensino médio, cursei na zona urbana, em uma escola estadual. Eu não venho de uma família de pesquisadores, meus pais tiveram pouquíssimo acesso à educação institucional porque precisaram trabalhar desde cedo, mas a educação sempre foi o objetivo deles para mim e para os meus irmãos”.
Após concluir o ensino médio em 2014, ela ingressou na UEPB em 2015. No ano seguinte, foi selecionada para o PIBIC, cota 2016-2017, sob orientação do professor Marcelo Medeiros da Silva. A pesquisa teve como tema a escritora Júlia Cortines, pouco lembrada na historiografia literária brasileira. “Pesquisar e escrever sobre esse tema abriu um universo novo. Além de prestar um importante serviço de visibilização dessa escritora e de seus textos, a partir dessa pesquisa comecei a participar de congressos e outros eventos, apresentando comunicações e ministrando minicursos em outras universidades”, relembrou.
Durante o XXIV Encontro de Iniciação Científica, realizado em 2017, a pesquisa desenvolvida por Josivânia conquistou o 1º lugar na área de Linguística, Letras e Artes. Nos anos seguintes, ela e seu orientador deram continuidade aos estudos sobre a poesia de autoria feminina. Na cota 2017-2018, a pesquisa teve como foco a obra de Júlia da Costa, período em que Josivânia publicou seus primeiros artigos em revistas especializadas. Em 2018-2019, o trabalho abordou a poeta Francisca Júlia. Já na cota 2019-2020, o tema foi a produção literária de Vitória Lima.
Como ela mesma relatou: “da cota 2018-2019 veio o meu segundo prêmio na área de Linguística, Letras e Artes, também conferido pela UEPB, o qual resultou em uma publicação do texto como capítulo de livro, que foi organizado pela Editora da Universidade”. Seu trabalho de conclusão de curso foi resultado desses projetos de pesquisa desenvolvidos no PIBIC.
Em 2021, ela ingressou no Mestrado em Literatura e Interculturalidade (PPGLI), sob orientação do professor Wanderlan da Silva Alves. Dois anos depois, sua dissertação recebeu o Prêmio Rosilda Alves Bezerra. No mesmo ano, deu continuidade à trajetória acadêmica ao iniciar o doutorado no mesmo programa.
Para Josivânia, a pioneira na família a terminar uma graduação e a primeira a entrar em um doutorado, sua trajetória é fruto da formação contínua. “Está completando, em 2025, dez anos desde o primeiro dia em que eu ingressei na UEPB, e nesses anos a pesquisa atravessou a minha vida das mais variadas formas, desde o PIBIC, durante a graduação, até o doutorado”, destacou.
Ela enfatiza ainda que essa trajetória foi feita em conjunto: “não posso deixar de ressaltar também a condução das pesquisas, o profissionalismo dos meus orientadores, tanto do meu orientador do PIBIC, quanto do meu orientador do mestrado (que segue comigo no doutorado), porque os prêmios, as participações em congressos, os artigos e os capítulos de livros publicados são os resultados de parcerias que deram certo”.
A Iniciação Científica também marcou a trajetória de José Lima Silva Júnior, mestrando no Programa de Pós-Graduação em Odontologia. Egresso da rede pública de ensino, ele afirma que o PIBIC foi um divisor de águas em sua vida. Participou de três cotas consecutivas: 2020-2021, 2021-2022 e 2023-2024. As duas primeiras foram orientadas pelo professor Alessandro Leite, e a última, pela professora Ana Flávia Granville-Garcia, que hoje o orienta no mestrado.
Ele relembra que a jornada não foi fácil. Embora tenha sido contemplado com um edital da Pró-Reitoria Estudantil (Proest), que possibilitou o empréstimo de alguns instrumentais, grande parte dos materiais e equipamentos foi adquirida com recursos da bolsa de Iniciação Científica. Ainda assim, ele faz questão de destacar que o PIBIC representa muito mais do que apoio financeiro. “Participar do PIBIC foi o que orientou e deu base para a minha escolha profissional. Através do programa, conheci o lado pesquisador da profissão de cirurgião-dentista. Essas experiências, junto com a orientação dos professores, me inspiraram a seguir esse caminho”.
Para além de custear parte dos gastos com instrumentos a bolsa foi muito importante. “Como o curso é integral e o programa exige dedicação exclusiva, é difícil trabalhar ao mesmo tempo. A bolsa foi essencial para que eu pudesse me manter na universidade”, destaca.
Ele ainda ressalta que foi na IC que teve a oportunidade “de fazer networking, onde conheci pesquisadores da UEPB e de outras instituições, e participei de pesquisas em colaboração”. Foi durante a Iniciação Científica que ele se aproximou da docência, ao atuar como monitor nas disciplinas de Bioestatística e Periodontia. Atualmente, Silva Júnior é professor substituto no curso de Odontologia e afirma ter muito orgulho de lecionar no mesmo espaço onde se formou.
A iniciação Científica e a construção de uma carreira
Quem também ressalta a importância da Iniciação Científica em sua trajetória é Anilda Costa Alves, professora do Departamento de Letras do Centro de Humanidades, no Campus III da UEPB. Desde a infância, ela sonhava em ser professora, mas não imaginava o quanto esse desejo transformaria sua vida. Vinda de um contexto de alta vulnerabilidade social, é filha de pais com baixa escolaridade e cresceu em um lar sustentado com um salário-mínimo, o que tornava difícil cobrir as despesas básicas da casa.
Ela conta que sua história tomou o rumo do sonho em 2011, quando ingressou no Curso de Letras da UEPB, em Guarabira. Teve que entrar no curso noturno, pois já trabalhava. Na UEPB, tornou-se voluntária (PIVIC): “foi através desse programa que eu descobri a importância da pesquisa. Assim, eu me descobri como pesquisadora, e quanto mais eu pesquisava e estudava, mais sentia o desejo de aprender e continuar pesquisando. A IC foi me possibilitando maturidade científica e causando em mim a sensação de que tudo o que eu estava vivenciando através da pesquisa era só o começo”, relembra a docente.
Segundo ela, foi graças à Iniciação Científica que pôde participar de diversos eventos, apresentar sua pesquisa e trocar experiências com outros pesquisadores, sempre em busca de novos aprendizados. A experiência também contribuiu para o desenvolvimento de um trabalho de conclusão de curso (TCC) consistente, com discussões aprofundadas, o que se tornou um diferencial em sua trajetória acadêmica.
Como comemora, “a IC representa o início de tudo. A minha pesquisa da IC se tornou o meu TCC na graduação (2016); o TCC se desdobrou no projeto para minha entrada no mestrado (2017); e, após o término do mestrado, já dei início ao doutorado (2019), sempre na mesma perspectiva de estudo que eu vinha desenvolvendo na graduação”.
Em 2022, onze anos após ingressar como estudante, ela retornou à UEPB como professora substituta. Emocionada, conta como foi a experiência de voltar para “casa”. “No contexto em que eu vivia, havia todas as chances para tudo dar errado, mas a pesquisa fez brotar em mim uma força que eu jamais imaginei ter. Eu tive a certeza de que eu era capaz de ocupar aquele espaço de professora ‘da casa’, professora ‘da minha casa’. Através desse processo seletivo, tive a minha primeira oportunidade profissional no ensino superior”, destacou muito emocionada.
Segundo ela, os primeiros dias de docente, era muito emocionante, “Era uma felicidade fora do comum. Uma sensação de gratidão a tudo que a própria UEPB me proporcionou enquanto aluna, através dos programas, como a IC; através dos professores excelentes que eu tive e das discussões que eles estabeleciam durante as aulas; e através dos eventos que participei”, ressaltou. Ela foi orientanda do professor Leônidas José da Silva Júnior, do curso de Letras do Centro de Humanidades (campus III).
Apesar do orgulho e da alegria ainda sabia que era uma vaga temporária. Mas a alegria maior veio este ano, quando ela tomou posse como docente efetiva da UEPB. “Eu não consigo não me emocionar ao relembrar tudo o que me aconteceu. A UEPB mudou a minha vida e essa mudança teve início através da IC. Hoje eu sou, não só uma profissional, mas uma pessoa realizada, pois muito além de trabalhar na profissão que eu sonhava na minha infância, eu consegui mudar não só a minha história, mas a história da minha família”.
A Iniciação Científica também transformou a trajetória de Mariane dos Santos Monteiro Duarte, aluna do Campus III. Quando terminou o ensino médio, ela queria cursar Educação Física, “porque eu já gostava de exercícios físicos, mas eu passei para Letras Inglês”, conta. No entanto, foi aprovada para Letras/Inglês, área pela qual se interessou especialmente pela fonética. Foi nessa área que conheceu o professor Leônidas, que a convidou para participar da Iniciação Científica.
Conforme Mariane, “o PIBIC foi o divisor d’águas em minha vida, pois me abriu portas no sentido do mundo científico, de pensar como pesquisadora, não apenas como professora. A partir dali eu consegui me ver mais ativa na graduação e foi algo que me fez um diferencial muito grande”. Ela ainda conta que foi o PIBIC que a fez ter outros sonhos e lutar por eles.
Em 2018, no XXV Encontro de Iniciação Científica, Mariane e o professor Leônidas venceram o primeiro prêmio na área de Linguística, Letras e Artes. O trabalho deles foi incluído como capítulo no livro publicado pela editora da UEPB. O impacto da pesquisa foi tão grande que Mariane fez especialização e seguiu para o mestrado em Linguística. “Sou muito grata ao professor Leônidas, que esteve comigo, além disso foi meu orientador, tanto na graduação como na especialização”, destacou.
Além do primeiro prêmio concedido pelo comitê científico do XXV Encontro de Iniciação Científica (ENIC) da UEPB, “esse projeto foi indicado ao Prêmio Nacional da Iniciação Científica e ficamos em 74° lugar no CNPq nacionalmente”, o professor Leônidas, orientador de Mariane e de Anilda, e hoje colega de trabalho das duas, relembra o percurso com orgulho.
A professora Mariane Duarte relembra que 2018 foi um ano marcante, não apenas pelo prêmio recebido, mas também por abrir novas possibilidades. Entre elas, destaca a participação no Top Espanha, programa de intercâmbio patrocinado pelo Banco Santander, que oferece a estudantes de graduação a chance de estudar espanhol na Universidade de Salamanca, na Espanha, por três semanas. A experiência foi tão significativa que ela integrou o livro Experiências de Intercâmbio da Comunidade Acadêmica da UEPB, onde relata sua estadia no país europeu.
Além das diversas experiências proporcionadas pela Iniciação Científica, Mariane Duarte tornou-se colega de trabalho de seus antigos professores. “Era meu sonho desde a graduação, lecionar numa instituição de ensino superior”, rememora.
Desde 2023, ela atua como professora substituta no campus III da UEPB, que, como a professora Anilda definiu, é “sua casa”. “Está sendo uma experiência muito, muito rica, gratificante, um conhecimento excelente. É onde eu me sinto em casa. É muito bom! Você tem aquela visão, quando está se graduando, de um dia poder estar ali em outra oportunidade, e isso foi concretizado. E passou a ser colega de trabalho de quem a orientou.
A Iniciação Científica também transformou a vida de Naara Felipe da Fonsêca, doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Inovação Tecnológica em Medicamentos da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
Ela conta que quando “ingressei na universidade, eu não fazia ideia do que era estar em um curso superior. Meus pais não concluíram o ensino médio e nenhum familiar próximo tinha conseguido, até então, cursar o ensino superior. Então, a universidade sempre foi um mistério para mim: como um sonho distante que eu precisava conquistar”.
Naara entrou na graduação em Farmácia da UEPB em 2016. No entanto, seu contato com a Iniciação Científica ainda foi no ensino médio. “Por ser de escola pública, no segundo ano do ensino médio, consegui uma bolsa para Iniciação Científica de meninas nas ciências exatas e engenharia. Eu não fazia ideia do que se tratava, mas, como era uma oportunidade que me deixaria próxima da universidade e, por incentivo dos meus pais, comecei a frequentar um laboratório de pesquisa na UFCG como aluna de ensino médio”, relembra.
Nessa época, era aluna da Escola Estadual de Ensino Médio Severino Cabral, e tinha apenas 16 anos e não percebeu a oportunidade. “Infelizmente, por falta de maturidade e pelos estudos para o ENEM, não cheguei a concluir o projeto proposto. Porém, aquele contato com a pesquisa despertou algo positivo em mim: como se eu realmente tivesse achado um caminho a seguir”, sublinha a doutoranda.
Quando iniciou o curso de Farmácia já tinha um objetivo claro: “fazer parte de um laboratório de pesquisa. Mas não fazia ideia de como fazer isso, até que, conversando sobre esse meu desejo com os professores, conheci o Laboratório de Desenvolvimento e Ensaios de Medicamentos (LabDem/UEPB) Lá, fui extremamente bem recebida e tive contato com a pesquisa por meio dos incentivos à Iniciação Científica. Foram três projetos desenvolvidos, uma premiação, dois artigos e muitos resumos publicados”, orgulha-se.
Em 2019, ela recebeu o primeiro prêmio na área de Ciências da Saúde, durante o XXVI Encontro de Iniciação Científica da UEPB. No ano seguinte, conquistou o segundo lugar na modalidade oral do I Congresso de Ciências Aplicadas à Saúde (CONCAF), realizado na Universidade Estadual Paulista (Unesp). Em 2023, ano em que concluiu o mestrado e ingressou no doutorado, foi agraciada com uma menção honrosa por sua apresentação oral no IX Simpósio de Plantas Medicinais do Vale do São Francisco, promovido pela Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf).
Atualmente, o LabDem é coordenado pelo professor João Augusto Oshiro Junior, que foi coorientador de Naara durante a Iniciação Científica, ao lado da professora Ana Cláudia Dantas, então coordenadora do laboratório e orientadora da pesquisa. Posteriormente, o professor Oshiro Junior também orientou Naara no mestrado em Ciências Farmacêuticas.
Mas tanto para Naara quanto para sua família, o maior prêmio está próximo a acontecer. “Daqui a 20 meses, serei a primeira doutora da minha família, e deixo meus sinceros agradecimentos à Iniciação Científica da UEPB”.
Ela expressa gratidão por entender que o aprendizado e a formação curricular adquiridos durante a graduação foram fundamentais para seu ingresso no mestrado e, posteriormente, no doutorado. “Além disso, foram essas oportunidades que aperfeiçoaram a profissional que sou hoje. Tento passar isso para as alunas de Iniciação Científica que acompanho diariamente: que é possível, sim, desenvolver boas pesquisas e usar dessas oportunidades para moldar o futuro”, chamou a atenção.
Os depoimentos dos estudantes evidenciam a relevância da Iniciação Científica como instrumento formativo. Ao proporcionar vivência direta com a pesquisa, o programa amplia a capacidade analítica, fortalece o espírito colaborativo e contribui de forma decisiva para a preparação dos futuros profissionais diante das exigências da vida acadêmica e do mercado.
Zélio Sales
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